34 plátanos
- isoladosproj
- 2 de jun. de 2020
- 3 min de leitura
Por Bianca Zilio Scottá
No ano de 2000, Daniela e Clóvis André Schumann começaram a namorar e
resolveram construir, no terreno da mãe de Clóvis, um pequeno apartamento para
alugar. Dia 27 de junho. A cada ano que a construção fazia aniversário, crescia
cada vez mais, tanto para os lados, quanto para cima. Se os queridos hóspedes
ficassem um ano sem visitá-la, quase não reconheceriam o local. Um apartamento
se tornou um sonho. Os clientes cresceram. Hoje, são 34 apartamentos tipicamente
alemães, localizados na Serra Gaúcha, em Nova Petrópolis. A Pousada. “Sempre
foi uma loucura, ela crescia muito rápido”. Daniela se diverte relembrando o início de
tudo.
A Pousada amadureceu muito ao longo dos 20 anos de vida. Sofreu crises,
mas sempre achava um jeito de seguir em frente. Até que, no dia 13 de março, teve
que fechar, devido a pandemia. Foi a primeira vez em que ela realmente fechou as
portas. Foi para a saúde de todos, claro. Mas as contas continuam a chegar e,
fechados, a família não possui outra renda. “Está sendo um momento muito
marcante. Nós passamos por dificuldades, mas sempre conseguimos dar a volta por
cima”. Daniela ainda tem esperanças. Uma nova estrutura, que estava sendo
construída para celebrar as duas décadas de serviços, está parada. A festa de
comemoração, que duraria um final de semana inteiro, cancelada. Um sonho
atingido em cheio e exatamente no coração.
A tristeza dominou o casal nas primeiras semanas do fechamento. Para
quem sempre lidou com pessoas e estava acostumado com a Pousada cheia, o
silêncio incomoda. Quase ninguém é capaz de tolerá-lo por muito tempo. Machuca.
A falta de contato, ainda mais. Por enquanto, nenhuma nova história está sendo
ouvida. Nenhum novo rosto está sendo conhecido pela primeira vez. Mas o barco
precisa continuar navegando. “Se deixarmos a peteca cair, acabamos ficando
doentes”. A preocupação da dona do estabelecimento é nítida em sua voz. Ninguém
estava preparado. E ninguém sabe o que ainda está por vir.
Ter que recomeçar, sentar e repensar tudo o que já foi feito, fez o casal se
lembrar de quando só havia um apartamento. Vinte anos de história. Duas décadas
em que a Pousada foi lar, mesmo que por pouco tempo, para centenas de pessoas.
Noites frias de inverno. Noites quentes de verão: a “safra” do estabelecimento.
Turistas que escolheram a dedo um local de descanso, de paz e de calmaria.
Clientes que não optaram por Gramado e sim por Nova Petrópolis.
Cada grãozinho que precisou ser movido do lugar de origem, cada reforma,
cada construção, cada móvel novo. “A pandemia nos fez lembrar de tudo que
passamos para chegar até aqui”, se emociona Daniela. O devido valor só vem,
quando se perde. Ver a Pousada fechar, para o bem de todos, também é perda.
Dói.
Não faz parte do propósito. Nunca irá fazer. Portas fechadas não combinam.
Um lar deve ser um lar a qualquer momento.
No dia 1º de maio, por decreto municipal, a Pousada pôde voltar a abrir. Mas
toda a estrutura teve de ser repensada e reavaliada. Para os check-in e check-out, o
bom e velho papel e caneta foram aposentados. Agora, é por aplicativo. Mais uma
vez, a tecnologia salva. Os ambientes são limpos seguindo as recomendações. O
café da manhã reserva a culinária alemã. E também os horários. Tudo precisa ser
marcado com antecedência. E é muito novo para todos.
A impessoalidade reina. Mas, no momento, impessoalidade é segurança. O
contato é perigoso. A Pousada quebrou o silêncio, por um breve momento. As vozes
não estão mais as mesmas. O lugar também não. O clima, muito menos.
“O plátano é a árvore que está na subida da Serra Gaúcha. Acompanha a
Rota Romântica” explica Daniela. Catorze municípios. Um deles, Nova Petrópolis.
Lar do casal e de dois filhos adolescentes. Da família Schumann. E de futuros
netos. A árvore embeleza a Rota. Principalmente no outono, quando suas folhas
caem. Uma espécie de grandes dimensões que alcança muitos metros. A Pousada
também. Um Plátano, virou 34. Pousada dos Plátanos.
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